Efeito Coanda

Uma das modas do ano na Fórmula 1 é o tal escapamento que aproveita o efeito Coanda.  Aí fica todo mundo pensando:  “Que droga é essa?”  “É um sistema que aproveita os gases do escapamento para gerar mais downforce para o carro”  Não respondeu muito se você gosta de Fórmula 1 e da parte tecnológica dela.

O efeito Coanda tem esse nome em homenagem ao cara que o descobriu, o engenheiro romeno Henry Coanda (tem um sinal romeno no último “a” de Coanda, mas não vou escrever isso).  Trata-se de um efeito relacionado a viscosidade dos fluídos que surge quando este escoa sobre uma superfície.

Viscosidade é a propriedade que faz com que o fluido “cole” tanto nas superfícies pelas quais ele passa quanto as suas moléculas, mantendo-se uma massa unida.  De fato, pensar em fluidos sem viscosidade é bem estranho:  Imagine se a viscosidade da água fosse zero:  Você mergulharia em uma piscina e ao tirar a cabeça da água esta já estaria totalmente seca.  Isso aconteceria com qualquer parte do corpo, tomar banho seria muito esquisito, mas ao menos não precisaríamos de toalha.

Mas felizmente temos a viscosidade.  Num mundo sem essa maravilha, nossa vida seria radicalmente diferente e, provavelmente sequer teríamos motores, pois não teríamos um lubrificante decente.  A viscosidade está em todos os fluídos, alguns mais, como aquele óleo Ursa LA3, outros menos, como o ar.

Em um escoamento de um fluido sobre uma superfície qualquer, os efeitos da viscosidade são sentidos na proximidade da superfície.  Na verdade existe uma teoria (de Blazius) que diz que se forma uma camada-limite onde, dentro desta os efeitos viscosos são relevantes, e fora desta, eles podem ser desprezados.  O efeito Coanda reside, portanto nesta região de camada-limite.

Esse efeito é muito relevante nos projetos aerodinâmicos.  Não é ele quem faz os aviões voarem e os carros de Fórmula 1 grudarem no chão (o efeito é outro, da sustentação dinâmica, tem a ver com a teoria de Bernoulli), mas sabendo utilizar o Coanda, você consegue otimizar, e muito o seu projeto.  Basta ver que ele é capaz de desviar parte do escoamento.  Assim, você pode trabalhar em superfícies para direcionar o escoamento para onde você quer.

E é isso que fazem os gênios por trás dos carros de Fórmula 1 e aviões.  No caso da Fórmula 1 em específico, ele direciona os gases do escapamento.  Parece pouco?  Não, não é.  Senão vejamos:  Pelo regulamento para 2013, os motores da F1 devem ser V8 de 2,4 L de cilindrada.  Sabemos que os motores possuem um limitador de giros a 19000 RPM.  Se considerarmos que os gases nos cilindros saem todos pelo escapamento a cada ciclo do motor, e imaginando que seja como num motor de carro comum, ou seja, a cada “passo” dois cilindros estão em determinado tempo (admissão, compressão, expansão e exaustão), com o carro a 19000RPM, a vazão de gases saindo do escapamento é de 11,4 m³ por minuto.  Sim, isso é coisa pra caramba.  Além disso, esses gases saem quentes e em alta velocidade, ou seja, há muita energia ali.  Aproveitar esses gases é de suma importância no projeto de um Fórmula 1.

Já sabemos o princípio que eles utilizam para desviar os gases do escapamento (na Fórmula 1).  Agora você está se perguntando:  “Mas pra onde esses gases estão sendo desviados?”  A resposta é simples:  Para os aerofólios, onde mais?  O que eles esperam ganhar com isso?  Bem, toda a aerodinâmica da Fórmula 1 só busca uma coisa:  Fazer o carro ficar mais grudado no chão possível com o menor arrasto possível.

Para gerar o efeito-solo (que nada mais é que a força de sustentação voltada para o chão, como uma asa de avião ao contrário), a pressão do ar na parte inferior dos aerofólios do carro tem que ficar menor que a pressão na parte superior do mesmo.  Para isso, o ar que passa por baixo tem que ter uma velocidade maior que o ar que passa por cima.  O Efeito Coanda entra nessa parte.

Você tem um fluxo de gases quentes e rápidos saindo do escapamento. Precisa fazer algo com ele, porque senão ele vai te atrapalhar.  Mas ao invés de atrapalhar, esses gases podem te ajudar.  Redirecionando-os por meio de superfícies aerodinâmicas, você pode fazê-los passar por baixo de um aerofólio, aumentando ainda mais a velocidade e reduzindo a pressão.  Ou ainda, fazendo com que passe pelos difusores, criando uma depressão e “puxe” os gases que passam por baixo do carro, melhorando o efeito-solo.  Há muito o que pode ser feito.  Isso fica por conta dos projetistas.  E não, eles não vão contar a você o que estão fazendo.

Para ilustrar esse efeito, fiz uma brincadeira na pia da cozinha e tirei umas fotos.  Se você quiser curtir com a cara de alguns estagiários, vale fazer isso no trabalho e fazer com que eles descubram o que está acontecendo. (clique para ver maior)

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Sobre Fernando Vieira

Engenheiro Mecânico. Trabalha no Rio mas mora em Petrópolis. Fez esse blog, pra comentar sobre tudo um pouco mesmo sem entender de nada.
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5 respostas para Efeito Coanda

  1. Pingback: A Fórmula 1 verde. Para inglês ver. | Blog do Fernando

  2. Aniceto Ferreira e Carvalho disse:

    Espetacular explicação

  3. E repito: Espetacular explicação

  4. Gabriel Moura disse:

    Parabéns cara, está me ajudando MUITO em minha monografia.

  5. grande explicação muito bom eu tbm quero ser engenheiro mecânico

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